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29/05/2010

Manawyddan, O Filho De Llyr




Quando os sete homens mencionados anteriormente, haviam enterrado a cabeça de Bendigeid Vran, no Monte Branco de Londres, com seu rosto voltado a França; Manawyddan olhou as terras de Londres, e sobre seus companheiros lançou um grande suspiro; e muita dor e pesar cairam sobre Manawyddan. “Ai de mim, Poderosos Céus, que tamanho infortúnio me toma,” ele disse. “ninguém, nem mesmo eu, poderei descansar esta noite.” “Senhor,” disse Pryderi, “não sofras tanto. Teu primo é rei da Ilha da Força, e mesmo ele pensando mal de ti, tu nunca hás reclamado terra ou posses. Éres o terceiro príncipe deserdado.” “Sim,” respondeu, “mas mesmo sendo este homem meu primo, dói-me ver qualquer pessoa no lugar de meu irmão Bendigeid Vran, não posso ser feliz vivendo no mesmo lugar que este vive.” “Vais tu seguir os conselhos de outro?” perguntou Pryderi. “Continuo necessitando conselhos,” ele respondeu, “e como conseguirei tal conselho?” perguntou Manawyddan “Sete Cantrevs* restam a mim,” disse Pryderi, “onde minha mãe Rhiannon vive. Eu a deixarei sob seus cuidados, assim como os Cantrevs, e mesmo não possuindo terra alguma, possuirás os sete mais belos Cantrevs. Kicva, filha de Gwynn Gloyw, é minha esposa, e de tal forma os Cantrevs a mim pertencem, e então Rhianonn e tu os usufruirão, e se algum dia desejares alguma posse, estes Cantrevs tu possuirás.” “Não posso, senhor” disse ele; “Que os Céus lhe recompensem por sua amizade.” “Eu lhe mostraria a melhor amizade do mundo se permitices.” “Eu irei, meu amigo,” ele disse, “e que os céus lhe recompensem. Irei contigo procurar Rhiannon e suas posses.” “Faz bem,” Pryderi respondeu. “E acredito que nunca ouviste uma dama discursar tão bem quanto ela, e quando era jovem não existia dama mais bela. E até hoje sua aparência é impressionante.”
Eles seguiram em frente, e mesmo a jornada sendo longa, chegaram em um curto espaço de tempo a Dyved, e um banquete foi preparado para sua chegada a Narberth, que Rhiannon e Kicva providenciaram. Então Manawyddan e Rhiannon sentaram-se juntos e começaram a conversar, e com tal conversa o coração e pensamentos de Manawyddan se aqueceram perante Rhiannon, e ele pensou que seu coração jamais havia testemunhado uma dama tão cheia de graça e beleza como ela. “Pryderi,” disse ele, “Eu desejo que aconteça como disseste.” “E o que disseste Pryderi?” perguntou Rhiannon. “Senhora, disse Pryderi, “Eu ofereci a ti como esposa a Manawyddan, filho de Llyr.” “Tal vontade alegremente satisfarei,” disse Rhiannon. “Feliz também estou” disse Manawydda; “que os Céus recompensem aquele que me mostrou amizade perfeita como esta.”
E antes do término do banquete ela já se tornara sua esposa. Disse Pryderi, “Aguarde aqui o término do banquete, e irei a Lloegyr prestar homenagem a Caswallawn, filho de Beli.” “Senhor,” disse Rhiannon, “Caswallawn está em Kent, deverias então prolongar-se no banquete, e aguardar até que ele esteja mais próximo.” “Esperaremos,” ele respondeu. E assim terminaram o banquete. E começaram a fazer circundar Dyved, e caçaram como diversão. E ao irem através do país, perceberam que não havia terras mais aprazíveis para viver, nem territórios de caça tão formidáveis, nem tamanha abundância de mel e peixe. E tamanha era a amizade entre os três, que não se separavam nem de dia nem de noite.
E em meio a tudo isso, Pryderi foi a Caswallawn em Oxford, e prestou homenagens; e honorável foi sua recepção, e louvado ele foi por sua homenagem.
Após seu retorno, Pryderi e Manawyddan banquetearam e descansaram. Iniciaram um banquete em Narberth, pois era o palácio principal; e ali houve todo tipo de honrarias. E quando terminaram a primeira refeição naquela noite, enquanto os que lhes serviram comiam, levantaram-se e foram para Gorsedd de Narberth, e seu séquito os acompanhava. E quando lá sentaram-se, presenciaram um barulho de trovão, e com a violência duma tempestade, veio uma cortina de névoa, tão densa que não podiam ver um ao outro. E após a névoa, uma luz os circundou. E ao olharem para onde estavam, não viram o gado, as rezes, as moradias, nem casas, nem animais, nem fumaça, nem fogo, nem homem, nem habitante; pois estavam as casas da Corte vazias, desertas e desabitadas, sem seus homens e animais. E haviam sumido, sem saber o que havia ocorrido, exceto aqueles quatro.
“Em nome dos Céus,” gritou Manawyddan, “aonde estão as pessoas da Corte, e toda a minha hoste? Vamo-nos para descobrir.“ Então chegaram ao salão, e não havia ninguém; e foram ao castelo, e ao dormitório, porém ninguém foi encontrado; e no estoque de hidromel e na cozinha não havia nada além de desolação. Então os quatro comeram, caçaram, e descansaram. Então começaram a cruzar as terras e suas posses, e visitaram casas e moradias, e nada encontraram além de animais selvagens. E quando haviam consumido sua comida e provisão, alimentaram-se da caça, e do mel das colméias selvagens. E de tal forma passaram o primeiro ano de forma agradável, e o segundo; mas então começaram a sentir-se cansados.
“Em verdade,” disse Manawyddan “Não devemos prosseguir assim. Vamo-nos a Lloegyr, e procuraremos ofícios para ganhar nosso sustento.” E dedicaram-se ao preparo de selas. E de tal forma prosseguiram a Lloegyr, e chegaram a Hereford. E Manawyddan começou a prepará-las, e as ornamentou e coloriu com esmalte azul, da maneira que eram feitas por Llasar Llaesgywydd. E preparou o esmalte azul da mesma forma que o outro homem fazia. E de tal forma continua sendo chamado Calch Lasar (esmalte azul), pois Llasar Llaesgywydd o fez.
E enquanto tal trabalho podia ser feito por Manawyddan, nem sela nem habitação precisaria ser comprada de vendedor em Hereford; até que os vendedores perceberam que estavam perdendo seu sustento, e que ninguém mais comprava deles, exceto quem não conseguia o que procurava com Manawyddan. Então os vendedores se reuniram e concordaram em assassinar Manawyddan e seus companheiros.
Ora tal intenção foi alertada, e eles se aconselharam com relação a abandonarem a cidade. “Pelos Céus,” disse Pryderi, “não aconselho a fugirmos da cidade, mas que matemos esses homens rústicos.” “Não,” disse Manawyddan, “pois se lutarmos com tais homens, teremos má fama, e iremos para a prisão. Será melhor se formos a outra cidade e nos preservemos.” E de tal forma prosseguiram para outra cidade.
“Que ofício tomaremos?” perguntou Pryderi. “Fabricaremos escudos,” disse Manawyddan. “E temos conhecimento sobre tal ofício?” perguntou. “Tentaremos,” respondeu Manawyddan. Então começaram a fabricar escudos, e deram-lhes a boa forma dos escudos que conheciam, e os esmaltaram, como haviam feito com as selas. E prosperaram naquele lugar, de tal maneira que nenhum escudo mais foi requisitado na cidade, além dos escudos que eles preparavam. Rápido eles trabalhavam, e incontáveis escudos fabricaram. E de tal forma se tornaram marcados pelos artesãos, que se reuniram e decidiram assassiná-los. Mas Manawyddan e seus amigos foram avisados sobre as intenções destruidoras de tais homens. “Pryderi,” disse Manawyddan, “estes homens desejam nos matar.” “Não aceitemos isto de tais homens rústicos, e que os enfrentemos então.” “Não,” respondeu Manawyddan; “Caswallawn e seus homens irão ouvir notícias sobre tais acontecimentos, e estaremos em apuros. Vamos para outra cidade.” E para outra cidade foram.
“E o que faremos ?” perguntou Pryderi. “Confeccionaremos sapatos, pois entre os sapateiros não há coragem suficiente para molestarnos.” “Não sei nada sobre tal ofício,” disse Pryderi. “Mas eu sei,” respondeu Manawyddan; “e ensinarei-lhe a costurar. E não tentaremos vestir o couro, pois já o compraremos vestido e fazeremos os sapatos a partir daí.”
E então compraram os melhores cordões que haviam na cidade, e nada mais compraram além do couro paras as solas; e Manawyddan se associou ao melhor ourives da cidade, que confeccionou as fivelas dos sapatos, e as ornamentou, marcando da mesma forma que fazia desde que aprendeu o método. E de tal forma era chamado de um dos três marcadores de Sapatos Dourados; e , quando podia-se obter deles, nenhum sapato era comprado de outros comerciantes da cidade. E quando os sapateiros perceberam que seus ganhos estavam caindo (pois Manawyddan dava forma ao trabalho, e Pryderi costurava), eles se juntaram, e concordaram em assassiná-los.
“Pryderi,” disse Manawyddan, “estes homens estão decididos a nos assassinar.” “ E porque deveríamos suportar isso de tais ladrões caipiras?” disse Pryderi. “Melhor então matá-los.” “Não,” disse Manawyddan, “não faremos isso, nem permaneceremos em Lloegyr. Devemos ir a Dyved, e ver como está o lugar.”
E assim foram juntos até chegarem a Dyved, e foram direto a Narberth. Lá acenderam fogo, e sustentaram-se da caça. E de tal forma passaram um mês. E reuniram os cães, e lá aguardaram por um ano.
Certa manhã, Pryderi e Manawyddan levantaram-se e foram caçar, levando seus cães do palácio. E alguns cães correram a frente e chegaram a um arbusto que estava perto; e logo que se aproximaram do arbusto, recuaram rapidamente com os pelos eriçados. “Aproximemo-nos do arbusto,” disse Pryderi, “e vejamos o que há nele.” E ao se aproximarem enxergaram um um javali selvagem de pelos brancos que saltou do arbusto. E então os cães começaram a persegui-lo; mas ele abandonou o arbusto e enfrentou os cães sem recuar, até os homens se aproximarem. E quando se aproximaram, ele fugiu pela segunda vez, e pôs-se a enfrentá-los. E então eles perseguiram o javali até avistarem um vasto e altivo castelo, recém construído, num lugar onde jamais havia-se visto pedra ou construções. E o javali correu rapidamente ao castelo, e os cães perseguiram-no. E então os homens começaram a indagar sobre o achado de um castelo em um lugar onde jamais havia-se visto qualquer tipo de construção. E do topo do Gorsedd observaram e escutaram os cães. Mas ao se aproximarem não ouviram nem cão ou coisa parecida.
“Senhor,” disse Pryderi, “Irei ao castelo procurar os cães.” “Na verdade,” respondeu, “não seria sábio ires ao castelo, castelo este que jamais havias visto. Se seguires meu conselho, não entrarás. Quem quer que lançou um feitiço nesta terra fez este castelo aparecer . “Realmente,” respondeu Pryderi, “Porém não posso desistir de meus cães.” E mesmo com os conselhos de Manawyddan, Pryderi entrou no castelo.
Ao entrar no castelo, Pryderi não avistou homem ou animal, nem javali ou cão, nem casa ou habitação. Mas no piso central do castelo ele contemplou uma fonte trabalhada em mármore, e na márgem da fonte um vaso dourado sobre um pedaço de mármore, e correntes que pendiam do ar, e que ele não podia ver o fim.
Contente com a beleza do ouro, e com o rico trabalho artesanal do vaso, Pryderi a ele dirigiu-se, e tomou-o em suas mãos. E ao pegar o vaso suas mão ficaram presas a este, e seus pés ao mármore onde o vaso se encontrava, e toda sua alegria esvaiu-se, e ele não mais podia dizer qualquer palavra. E assim permaneceu.
Manawyddan esperou-o até o fim do dia. E mais tarde, certo de que não teria notícias de Pryderi e dos cães, ele voltou ao palácio. E ao entrar, Rhiannon perguntou. “Onde estão teus cães e teu companheiro?” “Contemple.” Ele respondeu, “a aventura que me envolvi.” E Manawyddan então relatou o caso a Rhiannon. “Mal companheiro foste tu,” disse Rhiannon, “e bom companheiro tu perdeste.” E com tais palavras ela se retirou, e foi rumo ao castelo seguindo as direções que Manawyddan havia dado. Encontrou o portão do castelo aberto. Não se intimidou, e entrou no castelo. E ao entrar, percebeu que Pryderi encontrava-se segurando um vaso, e foi em sua direção. “Oh, meu senhor,” disse ela, “que fazes tu aqui?” E segurou o vaso junto com ele; e no mesmo instante suas mãos ficaram presas ao vaso, seus pés ao mármore, e seus lábios não mais conseguiam falar. E assim veio a noite, e trovões passaram sobre eles, e veio o cair da névoa, e então o castelo desapareceu, levando Pryderi e Rhiannon.
Quando Kicva , a filha de Gwynn Gloew, percebeu que não havia ninguém no palácio, exceto ela e Manawyddan, ficou tão triste que não mais se importava com a vida. E Manawyddan ao ver tal fato disse: “Estás errada, se por medo choras. E chamo os Céus como testemunha de que não hás visto amizade mais pura que a amizade que lhe darei, enquanto os Céus desejarem que continue assim. Eu declaro-lhe na alvorada da juventude que manterei minha fé em Pryderi, e em ti. Não mais temas,” ele disse, ”pois encontrarás toda a amizade que puderes, a amizade que poderei lhe dar, enquanto os céus desejarem que continuemos em tal dor e sofrimento.” “Que os céus lhe recompensem,” ela disse, “pois assim desejo.” E a donzela tomou coragem e ficou contente.
“Porém,” disse Manawyddan, “não devemos permanecer neste lugar, pois perdemos nossos cães e não podemos conseguir comida. Vamos a Lloegyr pois será mais fácil conseguir sustento lá.” “Que assim seja, senhor.” Respondeu Kicva. E assim foram juntos a Lloegyr.
“Senhor,” disse ela, “que ofício seguirás? Consigas um que seja decente.” “Nenhum outro conseguirei,” respondeu ele, “que não seja o de sapateiro, como anteriormente fui.” “Senhor,” disse ela, “tal ofício não cai bem a um homem de berço tão nobre como o senhor.” “De tal título entretanto, abrirei mão,” respondeu Manawyddan.
E assim Manawyddan começou a trabalhar utilizando apenas o melhor couro que pôde encontrar na cidade, e da mesma maneira que havia feito em outros lugares, utilizou fivelas ornamentadas para os sapatos. E exceto ele, todos os sapateiros da cidade estavam sem trabalho. Pois nenhum sapato que não fosse feito por Manawyddan era vendido. E de tal forma permaneceram em Lloegyr por um ano, até que os sapateiros ficaram com inveja, e decidiram por fim assassiná-lo.
“Senhor,” disse Kicva, “devemos tolerar ameaças de tais homens rústicos?” “Não,” respondeu, “Voltaremos a Dyved.”. E para Dyved eles foram.
Ora, Manawyddan ao iniciar o retorno a Dyved levou consigo um fardo de trigo. Foi até Narberth, e lá residiu. E nunca havia estado tão satisfeito, como no momento em que avistou Narberth outra vez, e os campos onde havia caçado com Pryderi e Rhiannon. Manawyddan acustumou-se a pescar e caçar cervos em seu esconderijo. E então começou a preparar o solo e semeou um quintal, e outro, e um terceiro. E nunca no mundo havia brotado um trigo tão bom. E os três quintais cresceram prosperamente, e jamais havia-se visto trigo tão belo.
E assim passaram as estações até a chegada da colheita. E Manawyddan se dirigiu a um dos quintais, e percebeu que estavam maduros. “Irei ceifá-lo amanhã,” disse. E naquela noite ele retornou a Narberth, e no acinzentado amanhecer ele foi ceifar o quintal; porém, encontrou apenas palha. Todos as cabeças de trigo haviam sido cortadas em seus caules, e levadas para longe, e apenas palha havia restado. E tal fato o surpreendeu grandiosamente.
Então Manawyddan decidiu ir a outro quintal, e percebeu que estava maduro. “Muito bem, disse, “ceifarei este quintal amanhã.” E no dia seguinte, percebeu que apenas palha havia restado neste quintal. “Oh, Céus gloriosos,” exclamou, “Bem sei que a pessoa que deu início à minha ruína está completando-a, e destruiu o país junto comigo.”
E então Manawyddan dirigiu-se ao terceiro quintal, e avistou o precioso trigo que também estava maduro. “Que o mal me tome,” ele disse, “se eu não vigiar este lugar hoje a noite. Quem levou o trigo anteriormente, virá levar este. E então saberei quem é.” E então tomou suas armas. E começou a vigiar o quintal. E contou a Kicva sobre tudo o que acontecera. “Muito bem,” disse ela, “que pensas fazeres?” “Vigiarei o quintal esta noite.” ele respondeu.
Assim sendo, Manawyddan pôs-se a vigiar o quintal. E a meia-noite, surgiu um enorme tumulto. Ao olhar direito, Manawyddan enxergou a maior hoste de ratos do mundo, que não poderia ser superada em números ou dimensão. E ele não sabia do que se tratava, até que os ratos se dirigiram ao ao quintal, e cada um deles ao escalar o caule do trigo, o entortava com o peso e de tal forma cortava as cabeças de trigo, deixando os caules. Manawyddan percebeu que não havia sequer um feixe de trigo sem um rato pendurado. E de tal forma fugiram, carregando todas as cabeças de trigo.
Furioso e encolerizado, Manawyddan partiu para cima dos ratos; porém, não conseguia alcançá-los, como se fossem moscas ou pássaros no ar, exceto um deles que lhe parecia o mais preguiçoso. Manawyddan então correu atrás do rato e o pegou, colocando-o em sua luva e amarrando-na com um cordão, voltando assim para o palácio. Chegando ao salão onde encontrava-se Kicva, ele acendeu um fogo e pendurou a luva num grampo. “Que tens aí, senhor?” perguntou Kicva. “Um ladrão,” disse ele, “que estava a roubar-me.” “Que tipo de ladrão é este, senhor, que cabe em tua luva?” perguntou ela. “Mostrarei-lhe,” ele respondeu. Então Manawyddan mostrou a Kicva como os campos haviam sido destruídos, e como os ratos haviam vindo ao último quintal, bem em frente aos olhos de Manawyddan. “E um deles, sendo o mais lento de todos, se encontra agora preso em minha luva; amanhã enforcarei-o, e perante aos Céus, se os tivesse, enforcaria todos.” “Meu senhor,” disse Kicva, “isso é surpreendente; porém, não me parece correto que um homem de tua dignidade comece a enforcar tais animais. E se fizeres o certo, não tocarás na criatura, e a deixará ir embora.” “Que a dor me encontre,” disse Manawyddan, “se eu não enforcar os ratos que conseguir apanhar.” “Muito bem, senhor,” disse ela. “não há razão para que eu socorra este animal, exceto para previnir a infâmia contra ti. Faça então, senhor, como desejares.” “Se eu conhecesse, senhora, alguma razão para socorrer tal animal, ouviria teu conselho,” disse Manawyddan, “como não conheço, estou determinado a destruí-lo.” “Faça-o então,” respondeu ela.
E assim ele foi ao Gorsedd de Narberth, levando o rato consigo. Então Manawyddan armou duas forquilhas na parte mais alta do Gorsedd. E enquanto fazia isso, avistou um sábio se aproximando, usando roupas velhas e esfarrapadas. E havia sete anos que Manawyddan não via homem ou animal em tal lugar, exceto as quatro pessoas que lá viveram juntas até dois deles se perderem.
“Meu senhor,” disse o sábio. “bom dia para ti.” “Que o Céus lhe tragam prosperidade, e minhas saudações. De onde vens, sábio?” perguntou Manawyddan. “Eu venho, senhor, cantando desde de Lloegyr; mas porque perguntas?” “Porque nos últimos sete anos,” respondeu Manawyddan, “não vi homem algum neste lugar, exceto quatro pessoas em exílio, e a ti neste momento.”
“Realmentem senhor,” disse o sábio, “Eu atravesso estas terras para chegar nas minhas. E o que fazes tu neste momento?” “Estou enforcando um ladrão que me roubava,” respondeu. “E que tipo de ladrão é esse?” perguntou o sábio. “Apenas vejo um rato em tuas mãos, e mal fazes um homem como tu em tocar tal criatura. Deixe-o ir.” “Não libertarei-o, pelos Céus,” disse Manawyddan, “Peguei-o roubando, e a desgraça trarei a tal animal, enforcando-o” “Senhor,” disse o sábio, “ “Para não ver um homem como tu fazer tal coisa, darei-lhe uma moeda que recebi de esmola, para que libertes o animal.” “Não libertarei-o,” respondeu ele, “Pelos Céus, também não venderei-o” “Como quiseres, senhor,” disse o sábio, “exceto que não gostaria de ver um homem de teu nível tocando tal animal; porém, não me importo.” E o sábio seguiu seu caminho.
E enquanto posicionava a haste entre as duas forquilhas, avistou um sacerdote vindo em sua direção, montado num cavalo coberto de trapos. “Bom dia para ti, senhor,” disse ele. “Que os Céus lhe tragam prosperidade,” disse Manawyddan; “Tua bênção.” “A bênçãos dos Céus para ti. E o que fazes, senhor?” “Estou enforcando um ladrão que me roubava,” respondeu Manawyddan. “E que espécie de ladrão é esse?” perguntou o sacerdote. “Um criatura,” respondeu, “na forma de um rato. Estivera roubando-me, e agora estou lhe dando a merecida penitência.” “Senhor,” disse o sacerdote, “prefiso comprar-lhe a liberdade, ao ver-te tocar este animal.” “Confesso aos Céus, que não venderei-o nem libertarei-o” “É verdade, senhor, que ele nada vale; porém, prefiro ofertar-lhe três moedas, ao ver-te cair em infâmia por tocar em tal animal.” “Não aceito, Céus,” respondeu Manawyddan, “preço algum por ele. Pois merece a forca.” “Pois então, senhor, faça como desejares.” E o sacerdote seguiu seu rumo.
Então Manawyddan amarrou o nó no pescoço do rato, e quando estava prestes a puxá-lo, viu o séquito de um bispo com seus cavalos de carga, e seus criados. E o bispo se aproximou, e observou o trabalho de Manawyddan. “Senhor bispo,” disse ele, “tuas bênçãos” “Bênçãos dos Céus para ti,” disse o bispo, “que fazes tu?” “Enforco um ladrão que me roubava,” disse ele. “Não é um rato que vejo em tuas mãos?” “Sim,” respondeu Manawyddan. “E roubava-me.” “Aye” disse ele, “já que cheguei na hora final deste animal, pagarei um resgate por ele. Ofereço-lhe sete moedas, para não ver um homem como tu destruir uma criatura vil como esta. Solte-o e terá o dinheiro.” “Declaro aos Céus que não soltarei-o” “Se não aceitas por tal quantia, darei-lhe quatro-e-vinte moedas pela liberdade do animal.” “Pelos Céus, não libertarei-o, nem por tal quantia.” respondeu Manawyddan. “Se não vai libertá-lo por tal quantia, darei-lhe todos os cavalos que vê nesta planície, e sete fardos da bagagem, e os sete cavalos que os carregam.” “Pelos Céus, não libertarei-o,” ele respondeu. “Se não vais libertá-lo de tal maneira, dê-me diga-me preço que desejas.” “Muito bem,” disse Manawyddan. “Desejo a liberdade de Rhiannon e Pryderi,” ele disse. “Tal preço terás.” respondeu o bispo. “Porém, não soltarei-o ainda.” “O que queres então?” “Que o feitiço e a ilusão sejam removidos dos Cantrevs de Dyved.” “Isso também terás, portanto liberte o rato.”
“Não libertarei-o, enquanto não souber quem ele é.” Disse Manawyddan. “É minha esposa.” Respondeu o bispo “Pois mesmo sendo tua esposa, não libertarei-a. Porque ela veio a mim?” “Para despojar-lhe de seus bens,” ele respondeu. “Eu sou Llwyd o filho de Kilcoed, e eu lancei o feitiço sobre os sete Cantrevs de Dyved. E o fiz para vingar Gwawl o filho de Clud, devido a amizade que tinha com ele. E tomei a vingança de Gwawl sobre Pryderi, pelo jogo do Texugo no Saco, que Pwyll Pen Annwn jogou com ele, desavidamente na Corte de Heveydd Hen. E quando foi conhecido que tu virias habitar estas terras, minha família pediu-me para transformá-los em rato, para virem destruir teu trigo. E foi minha própria família que veio na primeira noite, assim como na segunda, e destruíram tuas duas plantações. E na terceira noite, vieram minha esposa e as damas da Corte para transformá-las, e assim o fiz. Ela está grávida, e se não fosse por tal condição, não conseguirias pegá-la. Devolverei-lhe Pryderi e Rhiannon; e retirarei o feitiço e ilusão de Dyved. Já contei-lhe quem ela é, portanto liberte-a” “Pelos Céus, não libertarei,” disse Manawyddan. “O que mais desejas?” perguntou ele. “Desejo que não haja mais feitiços nos Cantrevs de Dyved, e que nenhum seja colocado a partir de agora.” “Tal desejo terás,” disse ele, “Agora solte-a” “Não irei,” disse Manawyddan, “ enquanto não tiver certeza de que a vingança não cairá sobre Pryderi, Rhiannon, ou sobre mim.” “Tens minha palavra. E fizeste bem em pedir tal coisa. Em sua cabeça cairia todo tipo de problema.” “Sim,” disse ele, “por tal medo, pedi tua palavra.” “Pois bem, solte minha mulher” “Soltarei-a” disse Manawyddan, “Após ver Pryderi e Rhiannon soltos.” “Pois aqui estão,” respondeu.
E então Manawyddan avistou Pryderi e Rhiannon. E foi encontrá-los. Saudou-os, e sentou ao seu lado. “Ah, Chefe, liberte agora minha esposa,” disse o bispo. “Libertarei-a com alegria.” Disse Manawyddan. E então libertou-a
Então Llwyd tocou-a com seu cajado mágico, e ela retornou a forma de uma jovem, a mais bela já vista.
“Olhe envolta e contemplem suas terras,” disse ele, “e verão que tudo e todos, estão em seu melhor estado.” Manawyddan olhou a frente, e viu que a terra estava em bom estado, cheia de gado e habitações.
“Que prisão,” perguntou Manawyddan, “segurava Pryderi e Rhiannon?” “Pryderi tinha os knockers**do portão de meu palácio em seu pescoço, e Rhiannon foi presa após carregarem o feno em seu pescoço. Esta era a prisão dos dois.
E devido a tal prisão, esta história foi chamada de Mabinogi de Mynnweir e Mynord.
E assim termina esta parte do Mabinogi.



Notas:
* Cantref (plural Cantrevs): Medida galesa medieval, para divisões. 1 Cantref equivale a 100 unidades.

** Knocker: Pequena criatura elemental do folclore galês. Equivale ao leprechaun irlandês, e tem seu nome originado do seu hábito de bater nas paredes das minas mostrando onde existem veios de metais preciosos. São famosos por pregar peças.