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14/10/2009

Dom Duardos

Era pelo mês de Abril,
De Maio antes um dia,
Quando lírios e rosas
Mostram mais sua alegria;
Era a noite mais serena
Que fazer no céu podia
Quando a formosa infanta,
Flérida já se partia;
E na horta de seu padre
Entre as árvores dizia:
- «Com Deus vos ficade, flores,
Que éreis a minha alegria!
Vou-me a terras estrangeiras
Pois lá ventura me guia;
E se meu pai me buscare,
Pai que tanto me queria,
Digam-lhe, que amor me leva,
Que por vontade não ia;
Mas tanto ateimou comigo
Que me venceu co´a porfia.
Triste, não sei onde vou,
E ninguém não mo dizia!...»
Ali fala Dom Duardos:
- «Não choreis minha alegria,
que nos reinos da Inglaterra
mais claras águas havia,
e mais formosos jardins,
e flores de mais valia.
Tereis trezentas donzelas
Da alta genealogia;
De prata são os palácios
Para vossa senhoria;
De esmeraldas e jacintos
E oiro fino de Turquia,
Com letreiros esmaltados,
Que minha vida se lia,
Contando das vivas dores
Que me destes nesse dia
Quando Primalião
Fortemente combatia:

Matastes-me vós, senhora,
Que eu a ele não o temia...»
Sua lágrimas enxugava
Flérida que isto ouvia.
Já se foram as galeras
Que Dom Duardos havia.
Cinqüenta eram por conta,
Todas vão em companhia.
Ao som do doce remar
A princesa adormecia
Nos braços de Dom Duardos,
Que tão bem a merecia.

Saibam quantos são nascidos
Sentença que não varia:
Contra a morte e contra o amor
Que ninguém não tem valia.


Romanceiro, Almeida Garrett

medieval-costumes-1.jpg (image)

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