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19/04/2009

A rã e o rato


Trazendo viva guerra antigamente
Rãs e ratos, houve uma tão valente,
Que tomou em um choque prisioneiro
Um rato, que era entre eles cavalheiro.
Pediu-lhe este licença em certo dia,
Para acudir a um pleito que trazia:
Concedeu-lha. Era o rato precisado
A passar um profundo rio a nado:
Deu indício de medo; a rã lhe disse
Que se prendesse a ela e que a seguisse;
Que como no nadar tinha mais arte,
O poria, sem risco, da outra parte.

Aceitou, e de junca fabricaram
Uma boa tamiça a que se ataram;
Porém a falsa rã, que a má vontade
Encobria em finezas de amizade,
Desejava afogá-lo; e lá no meio
Puxava para baixo, e com receio
Puxava para cima o triste rato,
E faziam um grande espalhafato.

Passava acaso uma ave de rapina;
E vendo aquela bulha, o vôo inclina;
Pilha ambos pelo atilho; e a tal contenda
Acabou em fazer deles merenda
Ninguém creia em finezas de inimigo,
Porque o ódio se oculta e não se entende;
Para haver de meter-nos em perigo.
Sabemos que não fica sem castigo;
Porque às vezes no laço em que pretende
Ofender-me, também a si ofende:
Se padecesse só o embusteiro,
Menos mal; porém vou com ele atado,
E posso no penar ser o primeiro;
Por isso nada fico aproveitado,
E talvez aproveite algum terceiro
À custa do inocente e do culpado.

Couto Guerreiro (Trad.)